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  • Lua Malakian

Através da dor percebi como sou tão pequena, e ao perceber meu tamanho, entendi como meu sofrimento é tão insignificante. Pra quê sofrer? Por que sofrer? Não há motivos tão sólidos assim. É minha alma? Sim. É o meu coração? Também. Mas o que isso importa para o universo? Em cem anos mais ou menos, ninguém da nossa geração estará mais aqui. Seremos poeiras perdidas no esquecimento eterno desse universo em expansão que um dia voltará a se comprimir, e nem mesmo as galáxias majestosas com todo seu poder e imponência sobreviverá. Tudo no Universo está em movimento, girando, em espiral, inspirando e expirando.

Por isso, não existe valor em chorar ou sofrer por alguma coisa. Tudo passa e nunca mais volta, principalmente nós mesmos. Entendendo a inconstância e impermanência da nossa existência, podemos apreciar de verdade o momento presente, as pessoas que nos cercam, as coisas que damos valor porque elas existem naquele momento. Podemos largar tudo e ir atrás do que queremos. Porque é isso que importa. Não há porque permanecer com aquilo que nos faz mal. Desamarrar os nós das nossas vidas, das garras da rotina, das ilusões e das esperanças que nos prendem naquilo que não queremos, é dar o verdadeiro valor a vida.

Ontem eu pensava em escrever um texto feliz, pra iluminar meu dia e me fazer sentir melhor, de certa forma tentar fazer o que eu estava sentindo ir embora, o que é bastante difícil. Eu passo muito tempo sem falar muito, mas na minha cabeça nunca é quieto, eu sempre fico pensando e pensando, um pouco de tudo, o que pode ser minhas dores, minhas preocupações, ou meus sonhos e alucinações, que funcionam como uma válvula de escape (e no final sempre me fazem me sentir mais sozinha e irreparável).

Já ouvi várias coisas a respeito da depressão. Já a nomearam como “frescura” e dizem ser coisa de quem não tem o que fazer. Já falaram para eu ocupar minha cabeça e parar de pensar besteira. Falaram que eu deveria trabalhar mais, estudar mais e deixar de pensar em todas essas loucuras. Já falaram, também, que só reclamo e que uso o termo depressão porque me convém, para que as pessoas acabam com pena de mim. Outros já se incomodaram com o meu choro e falaram que eu precisava ir ao psiquiatra com urgência. O que ninguém entendia, porém, era o medo que eu sentia de falar das minhas dores, era o peso da angústia em me manter acordada, era o fato de eu buscar o refúgio dormindo para me esquecer da dor e fazer o tempo passar mais rápido. Era a luta de todos os dias de ter de enfrentar o seu “eu” em pedaços e, depois, juntá-lo novamente. Ninguém entendia o quanto eu queria sair daquilo: era uma como uma prisão. Eu era prisioneira dos medos, fracassos, mágoas e angústia. Ninguém entendia que eu não via mais graça em nada e isso não tinha nada a ver com antipatia. Não entendiam que a força que me puxava para cama era bem maior do que a que me encorajava a levantar dela e sair para o mundo para ver e conhecer pessoas. Eu não tinha forças para falar, saudar alguém ou mesmo me arrumar. Eu me olhava no espelho e gostava do meu pijama velho, rasgado e do meu cabelo bagunçado. Eu não me preocupava com isso, pois a bagunça e os rasgos eram bem maiores dentro de mim. Ah, como eu queria que fosse frescura, como eu queria que fosse uma fase, como eu queria que fosse preguiça e que só a vontade bastasse para mudar tudo aquilo. O que ninguém entendia era a autoestima perdida e o desencanto que se fazia presente. Ninguém conseguia ver a minha luta diária para virar a página, como eu me sentia impotente demais diante de tanta dor e, quantas vezes, eu não pensei em entregar os pontos. Quantas vezes eu chorei sozinha no banheiro para ninguém ver, quantas vezes eu quis dormir e acordar leve. Nunca chame algo assim de falta de fé ou de falta de Deus. Depressão não tem a ver com falta de religiosidade. Depressão tem a ver com conflitos, com situações que muitas vezes nos jogam no buraco. Depressão não é fraqueza e está bem longe disso. É como estar no meio da maré e ela querer te levar: você tenta, com todas as suas forças, mas uma hora cansa. A tal da depressão pode levar muita gente, se continuarem acreditando ser frescura, se continuarem achando que o outro precisa de motivos para as suas dores, que é falta de vontade ou que, sei lá, a pessoa é muito sentimental. Pode levar muita gente, como já tem levado, porque muitos continuam acreditando que remédios bastam e que ”é fase e vai passar”. Sabe, as pessoas querem ser ouvidas, elas têm sede de ver as suas dores acolhidas. Mas, em meio a tantos julgamentos e conceitos errados, eu preferia me calar, mesmo que isso não parecesse tão simpático. Era mais fácil dizer que estava tudo bem e depois chorar, do que ter que contar sobre mim e ter de ouvir uma resposta desagradável. Era mais fácil inventar desculpa para não sair, do que ter que enfrentar a mim mesma e a todos. Qualquer coisa era mais fácil do que ter que parecer bem. Ninguém parou para ver a tempestade que havia em mim. Ninguém entendia o quanto eu lutava pra não chorar quando estava rodeada de pessoas e que, cansada de tanto lutar contra esses sentimentos que me sufocavam, na maioria das vezes preferia o meu quarto. Não é do dia para a noite que você se liberta, é com apoio, é com ajuda, é com acolhimento e muito esforço. É um processo, é um leão que você mata todos os dias dentro de você, é sentir o seu dia tomando cor novamente devagarinho, é aprender a apreciar aqueles filmes velhos de que você tanto gostava e parou de assistir, é ler um livro novo e sentir prazer com cada frase terminada. É conseguir sorrir sem ter que fazer esforço, é olhar no relógio e querer parar o tempo ao invés de acelerá-lo. É ver a graça chegando aos poucos e a alegria fazendo morada. Não sou melhor do que ninguém por não ter me rendido totalmente, só eu sei o quanto é dolorido conviver com essa dor e a imensa falta de força que sinto todos os dias. No entanto, posso ser melhor do que muita gente que não entende que depressão não é e está bem longe de ser frescura.

Esse é o lado ruim de escrever, as pessoas irão te ver como alguém que as pode entender, e muitas vezes, você não irá querer dizer nada além do que está escrito. Eu costumo ser intolerante com quem tenta descarregar o fardo sobre mim. As mesmas histórias me cansam, e as pessoas raramente me acrescentam algo novo. É o mesmo pensamento ilhado sobre o que fazer com o lixo. Devem ter esquecido como se reciclar, não aprendem nunca a transformar seus corações de lata em algo que não polua o mundo. Tenho vontade de gritar nos ouvidos que sou apenas uma pessoa comum em um apartamento super arrumado, que se arrasta sobre os próprios medos. É duro ter que aceitar que a maior parte das pessoas que irão cruzar nossas vidas, serão totalmente previsíveis. Gosto de quem me faz gostar, surpreendendo do jeito que é. Existem aqueles que são como uma tocha que se acende no momento certo, iluminando as nossas vidas e aquecendo as nossas almas. Já outros, inflamam a qualquer momento, tentando se mostrar úteis, e nem percebem que estão fazendo do mundo o seu cinzeiro.

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